09/07/2025
Mauricio Orth
Site da Granja (SG) - Conte um pouco como foi a sua história.
Silvio Cabral (SC) - Bom, eu nasci em São Paulo e com três anos fui morar em Presidente Médici, Rondônia. Voltei pra cá com 10/11 anos. Morava lá no comecinho da Raposo, no Morro do Querosene. E estudava no Rio Branco, minha vida inteira, da quinta até o colegial.
SG - E quando você começou a militar na política?
SC - Então, a primeira vez que eu me recordo de pensar em política foi em 1989. Vendo o horário político, vi um discurso do Lula, ele falando que sabia o que era ir na feira, na hora da xepa, ir comprar. Falei, se eu votasse, eu votava nesse cara. Peguei minha bicicleta, procurei um diretório do PT, achei panfleto, comecei a distribuir. E desde esse dia nunca mais eu parei de fazer política. Até os16 anos, eu votava com a minha mãe, a gente discutia em quem a gente ia votar, não era muito difícil chegar num denominador comum. Foi assim, desde sempre.
SG - E em Cotia?
SC - Fui candidato à vereador pelo PT pela primeira vez em 2008, fiquei de segundo suplente. Trabalhei bastante até 2012, quando eu fui o mais votado do PT, com 1.317 votos, mas não deu quociente eleitoral. Já era essa nossa bandeira, esse trabalho da moradia, da regularização fundiária, desde sempre. Aí saí candidato a vereador (2016). A gente saiu no PMN. Outra vez um dos mais votados, mas não deu quociente eleitoral. Em 2018 a gente saiu no mandato coletivo para deputado federal. Aí em 2020 eu saí candidato a prefeito pelo PSOL. Só me afastei um pouco quando eu fui fazer faculdade de Direito em São Bernardo do Campo, mas quando eu me formei eu abri meu escritório na Rua Mazel.
SG - Esse final de história em Cotia, antes você trabalhou na gestão anterior, né?
SC - Na eleição de 2022, eu estava no PT como um dos coordenadores da região da campanha do Lula e do Haddad. E o prefeito, Rogério Franco, decidiu apoiar o PT. Com isso, de forma natural, a gente acabou se aproximando. Ele ajudou o Lula e o Haddad mesmo. Eu conheço o Rogério desde pequeno, percebi que muito do que as pessoas falavam dele não era verdade. Então a gente conversava. Eu queria (e quero) fazer regularização fundiária e cuidar de moradia. Aí o Guilherme Boulos me convidou pra fazer isso em Brasília. Eu já estava feliz da vida. Aí o Rogério falou “não, nem pensar, vc fica”. Falei 'Cara, eu fico!' Quando eu cheguei lá, a estrutura que eu tinha era nada. Era eu e eu. Tinha umas pessoas que cuidavam da regularização, mas faziam milhares de outras coisas.
SG - Já estava trabalhando com isso?
SC - Eu trabalho com isso desde 2003. Na verdade foi minha profissão, foi a área que eu escolhi do Direito.
SG - E esse trabalho de regularização, com o Rogério, sem estrutura?
SC - Como podia ter estagiário, cheguei a ter seis estagiárias comigo. Aí peguei a lista do que já estava sendo feito, em termos de regularização, no Cidade Legal (O "Programa Cidade Legal", da Secretaria estadual de Desenvolvimento Urbano e Habitação – SDUH, dá suporte e visa a regularização fundiária de núcleos habitacionais em áreas urbanas). Aí, eu olhei e pensei, pra fazer o (Jardim) Belizário, está bem adiantado, falta organizar. Fui no Cartório, dei uma boa arrumada e saiu o primeiro núcleo regularizado, teve muita comemoração. Daí pra frente, para resumir, eu comecei a fazer a regularização de 93 núcleos, 25 mil famílias.
SG – Nessa questão habitacional, tem um ponto delicado e importante, que é a parte ambiental. Se você regulariza todo e qualquer conjunto, como faz?
SC - Primeiro, nós estamos numa cidade que tem 74 mil moradias irregulares. Pelo menos 66% da cidade não tem documento no cartório. E não é por causa de ocupação. É porque a forma de crescimento da cidade foi desordenada. E onde tem crescimento desordenado, tem irregularidade fundiária. Eu fiz 32 planos diretores pelo Brasil. Todo lugar tem, porque o Brasil cresceu de forma desordenada. Por que Caucaia inteira não tem documento? Porque era um sítio. O cara vai, divide para os filhos. Os filhos vão dividindo para os outros. Vai vendendo, vai indo, vai indo.
SG – E a questão dos parcelamentos clandestinos, irregulares?
SC - Tem. E isso é uma coisa, é das coisas que eu mais quero combater aqui. Se deixar eu fazer do jeito que eu quero, eu garanto para você, não tem um loteamento clandestino e irregular em Cotia a partir de agora. Começou o primeiro, eu faço parar na hora.
SG - E os que já existem?
SC - Se deixaram o povo ser enganado, eu vou regularizar. Porque ninguém faz um loteamento irregular se não tiver a conivência do órgão público. Então alguém deixou vender para aquele coitado que comprou lá. E eu vou defender esse cara até o final. Ah, vai apurar quem fez? Vamos apurar. Aí é outra confusão.
SG - Mesmo sendo um crime ambiental?
SC – A lei é clara quanto a isso. Quando que você pode regularizar uma área de APP? Quando a regularização trouxer benefício ao meio ambiente. Como? Por exemplo, as pessoas moram em uma APP e não tratam o esgoto. Se você chegar ali e tratar o esgoto, você melhorou o meio ambiente. Um exemplo: A Vila Aclimação (a Vila Aclimação tem casas há mais de 30 anos.) está regularizada. Para quê? Para poder ligar o esgoto de todo esse povo. Então aqui nós beneficiamos o meio ambiente. Porque o jeito que está lá, está jogando merda no rio. Agora nós temos que cobrar da Sabesp para que ela ligue o esgoto (a Sabesp só liga o esgoto de casas regularizadas). Outro exemplo, Parque das Nascentes. Foi um crime ali, um estelionato, na verdade. Com o meio ambiente e com as pessoas que compraram e depositaram o sonho ali. O que tem que fazer? Regularizar. O que está ocupado, tem que regularizar. Vamos ser sinceros.
SG - Aí tem a parte que você, em paralelo com esse trabalho que você estava desenvolvendo, você resolveu se candidatar a vereador.
SC - Eu sempre quis ser candidato pelo PT. Tentei até o último minuto... Eu sabia que em qualquer lugar que eu fosse, se eu fizesse quociente eleitoral, eu ia me eleger, quando eu vi que não dava (pelo PT), fui para o PSD. Disputei e ganhei.
SG - E como é que aconteceu essa história de você sair da vereança para entrar no secretariado?
SC - Eu disputei eleição, fiz campanha para a Ângela. Só que para mim tem uma coisa que é clara, a eleição acabou na hora que fechou a urna. Eu conheço o Formiga desde os 14 anos. A hora que acabou a eleição, conversamos, eu percebi que ele tinha a mesma vontade de cuidar da cidade do que eu. Então eu falei para ele, pode contar comigo na Câmara.
Falei também que precisava ter um núcleo para cuidar do Minha Casa, Minha Vida e da regularização fundiária. O Formiga já tinha me chamado: “Você não quer assumir a secretaria? Mas tem um detalhe. A gente não pode fazer outra secretaria, você vai ter um desafio dobrado, cuidar do desenvolvimento social e da questão das periferias.” Falei, eu topo, mas deixa eu trabalhar do meu jeito. Ele falou, pode ir, vai lá. E aí nós estamos aqui.
SG - Boa, então eu vou ter que fazer mais uma pergunta. Com essa polêmica do Plano Diretor, a questão da verticalização. Como você vê a habitação popular e verticalização em Cotia?
SC - A verticalização em alguns locais da cidade é indispensável. Em outros ela é inviável. Onde nós vamos fazer as 600 unidades do Minha Casa Minha Vida, Conjuntos habitacionais Moradia Digna 1, 2 e 3? Onde ficarão as 572 unidades do Mandela? Sem verticalização, não faz. Então precisa verticalizar. Agora, não tem como colocar mais prédio na São Camilo. Então isso está errado. Mas eu vou dizer uma coisa para você. Estão deixando a cidade na berlinda. Voltar para a legislação de 2008. Não existe isso. O Formiga está preocupadíssimo e se esforçando ao máximo para superar essa situação.
SG - Cabral, uma canetada na vida, se você puder dar uma canetada, qual é que é? Se tivesse o poder para, numa canetada mudar uma coisa. Um tiro só.
SC - Boa pergunta, hein? Deixa eu pensar. Por incrível que pareça, na situação que está hoje o país, uma canetada, era com certeza, não sei se seria possível numa canetada, mas reduzir o valor dos alimentos da cesta básica em 70%. Acho que é isso, as pessoas estão com dificuldade de comer, acho que seria isso.
SG - Reduzir o valor da cesta básica, subsidiar isso de alguma forma. Muito bem, grato pela entrevista.