28/03/2025
Mauricio Orth
A empresa EcoRodovias Concessões e Serviços, vencedora do leilão do Lote Nova Raposo, assinou o contrato em 14 de março de 2025. Por sua importância para Cotia, especialmente pela sua função de interligação com a capital, o Lote Nova Raposo já foi assunto de diversas matérias aqui no Site da Granja. Até pelo nome do Projeto, nota-se que o foco, na maioria das vezes, priorizou a Rodovia Raposo Tavares.
O motivo de preocupação agora é a interligação Cotia - Embu.
Além de cuidar da interligação entre Cotia e capital, os 93 km que perfazem o Lote Nova Raposo terão um outro objetivo.
O Rodoanel nem foi concluído (falta o trecho norte) e apresenta há mais de uma década um problema crônico. Com um fluxo diário superando os 225 mil veículos, o trecho Oeste é o mais movimentado e por isso, saturado. Sua função dentro do Rodoanel é interligar as rodovias Régis Bittencourt (BR-116), Raposo Tavares (SP-270) e Castelo Branco (SP-280).
É aí que entra o outro objetivo do Lote Nova Raposo: Para aliviar o fluxo no trecho oeste do Rodoanel, o Lote prevê a criação de uma rota paralela para interligar essas rodovias, composta pela estrada da Roselândia (Rod. Coronel PM Nelson Tranchesi, SP-029) e por vias urbanas de Cotia e Embu das Artes. Portanto, o Nova Raposo tem também como objetivo desafogar o Rodoanel.
No trecho entre a Castelo e a Raposo, a tarefa, além de se colocar dois pedágios, é duplicar os 11 km da Estrada da Roselândia. Já para fazer a mesma coisa entre a Raposo e a Régis, onde está Cotia, a tarefa fica mais complicada. Neste trecho não existe uma estrada, mas ruas e avenidas em trechos urbanos e estradas de terra em trechos absolutamente arborizados e em áreas de preservação ambiental. Aqui o projeto prevê quase 20 km de uma via de quatro faixas pedagiadas atravessando áreas urbanas e de mata preservada. Cotia então será rasgada ao meio e terá, como aconteceu com a Raposo, uma separação definitiva entre os bairros atingidos.
Histórico do trecho
A ACISE – Associação Comercial Industrial e Serviços de Embu, trabalha desde 2013 na criação desse trajeto. Ele parte um caminho já utilizado como “rota de fuga” para a interligação da Raposo com a Régis em 14 km de asfalto e 9 km de terra. A ACISE o incluiu no PDUI - Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado da Região Metropolitana de São Paulo em 2017, ganhou o apoio do Conisud - Consórcio Intermunicipal da Região Sudoeste da Grande São Paulo e entregou o projeto nas mãos do pré-candidato a Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, em 2022. O projeto ganhou sinal verde da Secretaria de Engenharia e Projetos de SP e em junho de 2024, foi incluído na obras do Lote Nova Raposo.
Vizinhos surpresos
Apesar de ser proclamada pela ACISE como uma obra ”muito esperada pela população local”, moradores da região de Embu das Artes manifestaram surpresa e preocupação ao tomarem conhecimento do projeto. De acordo com organizações ambientais da região, essa nova estrada pode resultar na derrubada de milhares de metros quadrados de vegetação nativa, afetar cursos d’água essenciais para os mananciais da região e interromper corredores ecológicos utilizados por diversas espécies da fauna local. Em manifesto publicado pelo SEAE - Sociedade Ecológica Amigos de Embu, que atua desde 1972 no cinturão sudoeste de São Paulo, vc pode encontrar uma boa explanação sobre os danos socioambientais causados. Os moradores também questionam a falta de transparência e participação popular no processo, pois não houve audiências públicas em Embu das Artes, Cotia ou Itapecerica da Serra.
Consequências ambientais em tempo de extremos climáticos
Considerando um entorno de 03 km do traçado proposto, os impactos ambientais serão:
Água
Além da biodiversidade riquíssima, trata-se de uma região muito importante na produção de água para o Sudoeste da Região Metropolitana e para a capital. Um dos rios mais importantes é o rio Embu-Mirim, responsável por 30% de toda água distribuída pelo sistema Guarapiranga, para mais de 4 milhões de pessoas. Já o rio Cotia abastece mais de 450 mil pessoas. A obra impactará cerca de 350 nascentes, em quase 300 mil metros de rios.
Floresta e biodiversidade
Cerca de 50km² de florestas de Mata Atlântica em estágio médio e avançado de regeneração serão impactadas e mais de 150.000 espécies de árvores de médio e grande porte sofrerão consequências graves, o que provocará a ameaça de eliminação do habitat de mais de 300 espécies de fauna; O trecho também vai cortar ao meio a APA Embu Verde, que é uma Unidade de Conservação fundamental da região.
O que dizem os representantes do poder público de Cotia
O atual prefeito, Welington Formiga, respondeu ao Site da Granja em coletiva de imprensa, sobre quais seriam as eventuais contrapartidas do Nova Raposo: “É uma preocupação muito grande… foi uma decisão de cima para baixo, deveria ser mais democrático… estão muito preocupados em resolver um problema e descuidam de outro bem maior, irão destruir parte de nossa biodiversidade” disse o prefeito.
Em recente entrevista ao Site da Granja, o Secretário de Transportes e Mobilidade de Cotia, Marcos Nena, questionado sobre a ligação Cotia-Embu, respondeu: “A preocupação prioritária é a questão ambiental, hoje Cotia está dentro de um cinturão verde.” Sobre a falta de audiências públicas, Nena respondeu: “Eu discordo da forma que eles fizeram e da forma que o governo passado tratou a audiência pública. Somos o município mais impactado com a privatização da Rodovia.”
O “Movimento Nova Raposo Não” protocolou dois pedidos de reunião com a Prefeitura e com a Câmara dos Vereadores e aguarda ser atendido. O Movimento reforça a necessidade de soluções sustentáveis para a mobilidade urbana que incluam alternativas de transporte de massa e respeito ao meio ambiente. Recentemente, uma comitiva do Movimento se reuniu com o Secretário de Meio Ambiente, Paulo Cordeiro e aguarda desdobramentos.
Outro lado
Por outro lado, o impacto no sistema viário dentro do município já é sentido pelos moradores. O trânsito lento, asfalto das vias danificados, caminhões travados nas ruas estreitas ou íngremes, barulho e colisões são ocorrências diárias.
“Além dos problemas na educação e saúde municipais, a grande maioria da população destaca o problema da quantidade de veículos”, comenta Fernando Confiança, arquiteto e urbanista de Cotia com especialização em mobilidade e planejamento de cidades. “Atualmente demoramos aproximadamente 45 minutos sem trânsito seguindo pela Odair Pacheco Pedroso; com este novo trajeto, o tempo gasto deve ser 50% menor e com muito mais segurança”, continuou, em entrevista cedida ao Cotia Agora em janeiro deste ano.
Mas a que custo socioambiental? “Não se faz um omelete sem se quebrar alguns ovos”, disse Caio Portugal, Presidente da AELO - Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano, Vice-Presidente do SECOVI/SP e proprietário de empresa com mais de 70 empreendimentos realizados ao comentar sobre o Projeto Nova Raposo em conferência recente.
Porém, a falta de planejamento do Governo do Estado nos induz a uma pergunta: o Lote Nova Raposo teria a obrigação de resolver um problema do Rodoanel?