22/03/2022
Desde criança ele via o que ninguém mais ao seu redor podia ver. Era um olhar que atravessava qualquer pessoa ou objeto. Ele via dentro e fora com a mesma clareza. Via também os pensamentos e sentimentos de todos que cruzavam o seu caminho. Seus pais ficaram muito assustados e tentaram, de todas as maneiras, trazê-lo de volta à normalidade. Sabiam que isso causaria todo tipo de problemas que acabariam por destruí-lo.
Para protegê-lo de um destino muito perigoso, familiares, professores, amigos e vizinhos foram substituindo esse dom extraordinário por informações, treinamentos, conceitos e dogmas, fundamentais para a vida em sociedade.
Foi assim que um dos seres de uma nova geração, com talentos e poderes nunca vistos até então, se tornou na idade adulta um homem comum, correndo atrás dos prazeres e fugindo das dores, carente e dependente de tudo e de todas as coisas. Seus olhos agora viam apenas através das cores de sua educação, dos conteúdos e hábitos que aprendera. Seu treinamento de homem normal foi considerado um sucesso.
Ele fora enviado ao mundo, juntamente com outros bebês, para dar início a uma nova geração capaz de iluminar e transformar a vida humana. Os níveis superiores de inteligência do universo, entretanto, falharam em não prever a influência determinante de gerações e gerações que, desde o começo do mundo, foram condicionadas a servir às forças da natureza e da sobrevivência no planeta Terra.
E agora, o que fazer? Como trazer de volta à tona os heróis escondidos em corpos de escravos?
Em um planeta muito distante, figuras luminosas e iluminadas reuniram-se para resolver esta questão. Depois de longo tempo de estudos e reflexão, a maioria chegou à conclusão de que epidemias, cataclismos, guerras, mortes dos entes queridos, seriam suficientes para fazer esses seres de potencial tão extraordinário tomarem consciência de sua origem e de sua missão.
Foi quando a Grande Mãe se manifestou:
“O fluir da vida já propicia naturalmente todas essas situações tão difíceis e amargas, é inútil ampliar esse sofrimento. O ideal é colocarmos, no caminho de nossos enviados, Mestres e Escolas Espirituais em que o verdadeiro conhecimento ainda sobrevive. Dentro deles vibra um desejo nunca satisfeito de amor e de felicidade, basta um empurrão na direção certa e eles começarão a se lembrar de sua real identidade e a Luz Divina voltará a brilhar em vários pontos do planeta.”
E assim foi feito. É por isso que, no meio do egoísmo e da avidez, alguém se coloca no lugar do outro e estende a mão, que no meio de terríveis predadores surge um amável e sorridente doador.
É por isso que, no meio de tanta loucura e confusão, de vez em quando alguém levanta a cabeça e seu olhar mergulha no mistério insondável de uma noite profunda, enquanto seu coração pressente o esplendor solar de uma eterna alvorada.
Carmem Carvalho e Marian Bleier